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quarta-feira, 3 de setembro de 2014

A formação do leitor literário na escola

Roberto de Queiroz
GREG/DP
A escritora Tatiana Belinky, falando sobre como estimular o prazer da leitura na escola, disse o seguinte numa entrevista: “Há coisas que não se manda fazer, elas acontecem. E a leitura é uma delas. O leitor é livre. Você lê para você mesmo, para seu divertimento, para sua emoção, não tem obrigação de coisa nenhuma. Você começa a ler e vai logo perceber que é bom. Uma história bem contada pode fazer alguém chorar ou rir, isto é, pode prender o leitor” (Na ponta do lápis, nº 12, dez. 2009). Mas como fica a liberdade do leitor iniciante? Como é que alguém pode escolher o que não conhece?

Para Caio Riter, se cada aluno tem a liberdade de ir à biblioteca e escolher o livro a ser lido, ele é o responsável por sua formação leitora. Assim, quando é convidado para apresentar, apresenta “sua visão de leitura, não havendo na sala de aula espaço para a interação com diferentes leitores, em diferentes níveis de leitura, visto que poucos (ou apenas um) terão lido aquele texto, correndo-se o risco, inclusive, de o próprio professor não ter a mínima noção sobre o que trata cada um dos livros lidos por seus alunos” (A formação do leitor literário em casa e na escola, Biruta, 2009).

O escritor italiano Italo Calvino (1923-1985) disse certa vez que “ler é um ato de liberdade, mas para quem já [...] foi formado pela escola como leitor. Ou seja, o espaço escolar é o lugar da experimentação e esta se dá à medida que o aluno é desafiado a ler textos que passaram pelo critério de qualidade do professor e/ou que atendem a algum objetivo, cuja realização se faz necessária”.

Desse modo, a liberdade do leitor iniciante pode ser respeitada “quando a escola, através da obrigatoriedade da leitura e de uma prática metodológica que assegure espaço para a reflexão e para o deleite, forma leitores qualificados. A escola precisa mostrar aos alunos a importância da leitura e o conhecimento dos aspectos que a envolvem, além de apresentar, de forma qualificada, textos [...] cuja leitura, se não realizada na escola, sob o olhar atento e orientador de um professor-leitor, muitas vezes jamais ocorrerá” (Riter, op. cit.).

Em suma, pedir simplesmente que os alunos leiam um texto qualquer, sem a análise criteriosa e sem o planejamento prévio do professor, é coisa que pode parecer aula de leitura a um desavisado, mas, obviamente, não corresponde aos critérios de leitura como conteúdo em sala de aula. Ou seja, defendo a ideia de que a leitura de textos literários na escola pode ser uma leitura sem amarras (uma leitura que seduz e encanta o leitor e induz ao gostar de ler), mas a mediação do professor desempenha um papel fundamental na realização desse processo.


(Artigo publicado no Diario de Pernambuco, 02/09/2014, Opinião, p. A6)

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