A leitura dos textos selecionados por Roberto de Queiroz, para compor
este livro, causou-me algumas impressões que passo a compartilhar com os demais
leitores.
Inicio com o interesse do autor pelo debate que vem sendo travado
ultimamente no universo da educação, sobre a importância do texto literário no
processo da formação do leitor. Em relação a isso, importa destacar que Roberto
é professor de Língua Portuguesa e trabalha na rede municipal de ensino de
Ipojuca. Assim, ele não só acompanha
este debate à distância, mas está, como se diz popularmente, com a mão na
massa.
Além disso, afirmando a condição de professor, envolvido em projetos de
promoção e difusão da leitura nas escolas municipais, Roberto permite a
emergência da sua face de escritor, numa atitude de enfrentamento à angústia
diante da “nudez de escrever”.
Entre os diversos temas que ele aborda em seus artigos, interessa-me
particularmente a polêmica - muito salutar, do meu ponto de vista - sobre a não
dicotomia entre leitura e escritura.
Como eu vejo a questão, a leitura (do texto literário, principalmente
quando se trata do leitor aprendiz) alimenta o desenvolvimento da escrita, mas
os dois procedimentos são diferentes.
Entendo que este é o ponto emblemático do desafio atual da superação do
analfabetismo ou alfabetismo funcional: por que tantas pessoas não conseguem
adquirir a autonomia da escrita, deixando perplexos os professores e
pesquisadores diante da ação ineficaz das escolas quanto aos métodos de ensinar
a ler, que na verdade deveriam ser métodos de ensinar a escrever/reler?
A fluência do texto e o desenvolvimento do estilo são aprendizagens que
implicam em exercício autoral (dependem de uma atitude pessoal e da vontade),
que, por sua vez, são instigadas pela relação constante e ampla com os gêneros
literários diversos.
É impossível escrever bem se não se lê com frequência. E não falo de
qualquer leitura. Reafirmo que quando a questão em debate é a formação do
leitor - processo que começa antes e extrapola a fase da alfabetização, virando
uma prática de vida – é imprescindível o mergulho profundo no universo dos
textos literários, pois este é o melhor caminho para o exercício da reflexão,
principalmente sobre a condição humana, uma vez que a literatura, enquanto
patrimônio universal, é na verdade um grande legado da alma humana.
Este é o melhor caminho para se apropriar do vocabulário (fixar na mente
a grafia das palavras) e das estruturas narrativas da língua, o que é
fundamental para se aprender a escrever.
Este é o melhor caminho para aguçar a visão de mundo, aprender a
analisar, ter opiniões próprias, fazendo as conexões entre as subjetividades e
as grandes questões da existência; transitando entre a psicologia, a filosofia,
a sociologia, a antropologia, a história e as demais áreas do conhecimento.
Concluo com a leitura dos textos de Roberto que a paixão pela literatura
é o que move a sua prática, seja como professor, seja como escritor, seja como
cidadão, permitindo fazer essas conexões entre a literatura e as outras áreas
do conhecimento e posicionar-se na diversidade das perspectivas, com a própria
leitura/escritura de mundo.
Concluo que um professor de língua é acima de tudo alguém que gosta de
ler e aprendeu a pensar/perguntar. Que
consegue mediar a relação dos estudantes com a literatura, despertando o
interesse pelas grandes questões da existência, fazendo com que se posicionem,
desenvolvendo as próprias ideias e escrevendo os próprios textos.
E é isso que faz o professor Roberto de Queiroz com O Enigma do Olhar.
Recife, 31.01.2012.
* Carmen Lucia Bezerra Bandeira é
escritora, mestre em Educação pela Universidade Federal de Pernambuco (UFPE)
e membro do Centro de Estudos em Educação e Linguagem (CEEL), da Universidade
Federal de Pernambuco (UFPE).