Não
sou realista nem sou normal. Ser realista não significa ser normal. Ser
realista (de realismo + -ista) é prender-se fielmente ao que é real,
verdadeiro. Ser normal (do latim normale)
é seguir determinada norma, natural ou habitual. Não sou futurista. O futurismo
de Marinetti, conquanto não fosse normal, voltava-se exclusivamente para o
futuro, era antagônico à moral e primava pela exaltação à guerra. Havia nele
algo utópico e paradoxal.
Não
sou utopista. Não concebo nem defendo utopias. Não sou dadaísta. O dadaísmo de
Tzara não possuía cérebro: não havia nele passado nem futuro, havia apenas a
guerra, o caos, o nada. Não sou cubista. O cubismo era demasiado irracional,
desintegrado da realidade, instantâneo e anti-intelectualista, embora fosse
carregado de certa dose de humor. Não sou adepto do surrealismo. Só os loucos
rejeitam as concepções lógicas do cérebro e se apegam somente ao inconsciente.
Mas,
já dizia doutora Nise da Silveira, “os normais são burros”. Assim, há espaço
suficiente para todos (para os sãos e para os loucos). Inclusive, para os que
leem e não entendem (analfabetos funcionais) e os que veem e não enxergam
(cegos funcionais). E, não obstante eu seja não realista, crítico do futurismo,
dadaísmo, cubismo e surrealismo, vejo nessas vanguardas artístico-europeias,
principalmente nas duas últimas, uma grande evolução criadora. Afinal, foram
tais manifestações artísticas que revolucionaram o cenário cultural europeu e
mundial do século 20. E, apenas porque não sou realista nem sou normal,
reconheço o valor de toda e qualquer arte.
Se
os normais são burros ou não, não estou certo disso, mas eles, obviamente, não
cheiram nem fedem.
(Texto
publicado na Folha de Pernambuco,
25/10/2016, Opinião, p. 4)