Roberto de Queiroz
A
ciência de Jesus sobre o amor é algo que ficou provado desde sua
transitoriedade entre os homens. E tal ciência traz à baila a ignorância dos
homens acerca desse tema. Quer dizer, Jesus “amou sabendo, e os homens foram
amados ignorando” (Padre Antônio Vieira, Sermão
do mandato). Assim, o amor de Jesus sempre manteve um estado estático de
união direta com Deus, ou seja, Jesus sabia que eram seus os tesouros da
onipotência e que fora gerado de Deus e para Deus voltava.
Nesse
sermão, Vieira enxerga o amor de Jesus qual o vê o evangelista Lucas. Nesse
particular, achamos conveniente referir um comentário proferido pelo padre
Raymond Brown, professor da Union
Theological Seminary de Nova Iorque (Veja,
12/04/1995, p. 70). Para Brown, o Jesus de Lucas não foi abandonado pelos seus
discípulos, nem se confessa triste na hora da morte. Ele está em comunhão com
seu Pai todo o tempo, tanto que, apropriadamente, as últimas palavras do
crucificado não são um grito angustiado para seu Deus por quem se sente
abandonado, mas um tranquilo “Pai, nas tuas mãos entrego o meu espírito” (Lucas
23: 46).
Quanto
aos homens, Vieira afirma que, entre eles, o que vulgarmente se chama amor é
ignorância, a saber, tem mais partes de ignorância, e quantas tem de ignorância
tantas lhes faltam de amor. E prossegue: “Pinta-se o amor sempre menino,
porque, ainda que passe dos sete anos [...], nunca chega à idade da razão. Usar
de razão e amar são duas coisas que não se ajuntam. A alma de um menino que vem
a ser? Uma vontade com afetos, e um entendimento sem uso. Tal é o amor vulgar.
Tudo conquista o amor quando conquista a alma; porém o primeiro rendido é o
entendimento.”
Podemos
argumentar que, por esse critério, Vieira analisa a vulgaridade do amor dos
homens como sendo oriunda da ignorância deles, uma vez que esse autor dá ao
amor dos homens a caracterização de cupido, que é um menino – e meninice é a
idade anterior à razão –, caracterizando assim o amor daqueles como sendo
anterior ao uso da razão e incompatível com ela.
Por
fim, resta-nos dizer que o Sermão do
mandato – pregado na Capela Real em 1645 – é um dos mais belos sermões de
padre Antônio Vieira. E, apesar de traçar um paralelo entre o amor de Jesus e o
dos homens, sua temática central é o amor místico de Jesus. Por esse motivo, podemos
proferir que há uma consonância pragmática entre o amor divino e o de Jesus. Em
suma, a equidade do amor de ambos torna-os homogêneos e harmoniosos, de sorte a
não existir arbitrariedade entre eles, isto é, o misticismo do amor de Jesus
atinge um estado fixo de liame direto com Deus, de modo que o amor de um e
outro não vem a ser dois, mas apenas um.
(Artigo publicado na Folha de Pernambuco, 28/05/2013, Cidadania, p. 7)
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